quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

DE MUHAMMED PARA CRISTO


A conversão de muçulmanos ao cristianismo no contexto islâmico

O Islã é eterno. Ele sempre existiu como a verdadeira religião dada por Deus aos homens. Uma prova disso seria o fato de todos os proeminentes homens mencionados pelas Escrituras, terem se “submetido” aos decretos divinos. Desse modo, o islã é a religião “natural” da humanidade, e, portanto, não existe o conceito de conversão em sua doutrina da salvação, mas, o de reversão, tendo em vista que aqueles que se voltam ao islamismo estão retornando à religião original, estabelecida no princípio. Nesse sentido, os muçulmanos têm a convicção de que o cristianismo é uma religião ultrapassada, um vislumbre da verdadeira fé, propagada por Muhammed, e que culminará na reversão de todo o mundo aos preceitos de Allah.
Esse é apenas um dos aspectos que precisamos considerar na tentativa de entendermos a postura restritiva do islamismo quanto às conversões de seus adeptos ao cristianismo.
Um outro aspecto está relacionado ao sentido do islamismo para a vida dos muçulmanos. Após treze séculos, é possível ter uma visão mais ampla do significado que as pregações de Muhammed concederam primeiramente, para as tribos primitivas da Arábia pré-islâmica.
É certo, por exemplo, que o islã lhes ofereceu muito mais do que uma religião. Ele lhes concedeu a oportunidade de compartilharem a unidade, de propagarem por todo o mundo suas habilidades nas ciências, nas artes, na literatura, na medicina e em diversos aspectos da conduta humana. Eles desenvolveram um forte sentimento de pertença. O islã promoveu reformas importantes, estabelecendo novas relações sociais, seja no âmbito do parentesco, tanto quanto nas questões políticas e econômicas.
A religião concedeu a oportunidade de uma nova posição na sociedade para mulheres, pobres e escravos. Ao mesmo tempo, fortaleceu os aspectos que considerou mais positivos da cosmovisão árabe como a lealdade, a honra, a força, o orgulho, a hospitalidade e a família.
Posteriormente, com a adesão de vários povos ao islamismo, o seu significado para estes novos adeptos se concentrou nos preceitos religiosos, e na normatividade que estes deveriam ter na orientação da conduta diária dos muçulmanos. Além, é claro, da convicção de serem todos os muçulmanos (“submetidos”), pertencentes a uma mesma irmandade, a “UMMAH”, cabendo a eles, distribuídos em todo o mundo, promover a união da Dal-Islam (Casa do Islã). Uma união tanto no aspecto confessional, como político e econômico.
Um outro ponto a ser considerado, está relacionado com as questões históricas. Os conflitos travados entre cristãos e muçulmanos, só cooperaram para agravar ainda mais a situação de rejeição entre os dois grupos religiosos. Acontecimentos como as Cruzadas, a dominação ocidental sobre os países árabes, caracterizada como predatória e alienígena, o recente apoio da comunidade mundial a política israelense em detrimento aos direitos humanos e civis dos árabes e, as ações de política externa norte-americana, bem como sua presença nas guerras do Kuwait, Iraque e Afeganistão, apoiado pelos “aliados”, foram responsáveis por fortalecer as divergências. Para os muçulmanos, o cristianismo se tornou sinônimo de ganância, injustiça e opressão, porquanto, é a cruz de Cristo que é empunhada, seja nos escudos dos Cruzados ou no discurso maniqueísta de políticos das superpotências. As conseqüências práticas desses fatos históricos contribuem para reforçar desde as convicções acerca das doutrinas islâmicas, até os mais fervorosos discursos fundamentalistas, conclamando os muçulmanos ao ódio ao ocidente.
Outro aspecto são as divergências teológicas, como a salvação, a inspiração e inerrância das Escrituras, a divindade de Cristo e a trindade, para citar apenas as mais complexas. Essas divergências são os pontos mais sensíveis no processo de comunicação do Evangelho e à conversão dos muçulmanos a Cristo.
E, finalmente, há os conflitos ideológicos. As transformações ocorridas no ocidente, influenciadas pelo racionalismo, iluminismo, pragmatismo e empirismo, resultaram em cinco séculos de transformações do pensamento ocidental, nos âmbitos moral, artístico, político e religioso, produzindo uma sociedade relativista, sem padrões éticos ou morais definidos, onde a religião fere a razão, sendo relegada a uma posição secundária. Contrapondo-se a esta realidade, está a ideologia muçulmana.
Enquanto o ocidente passava pelas suas expressivas transformações ideológicas, o oriente árabe preservou sua identidade islâmica, e consequentemente, sua ideologia, aperfeiçoando-a através do movimento nacionalista. O nacionalismo árabe foi um movimento de valorização das raízes étnicas, culturais, sociais e religiosas, durante o período da dominação européia, que mesmo intervindo nas sociedades, não conseguiu transmuta-las. Os valores foram ainda mais considerados e enriquecidos pelos idealizadores do movimento. Contribuíram para a formação do nacionalismo três aspectos básicos: o conceito de “Terceiro Mundo”, a idéia de unidade árabe e a definição sociológica (e não a religiosa) do socialismo.
O nacionalismo foi importante no processo da luta pela independência do domínio ocidental e um equilíbrio quanto à educação e idéias recebidas dos dominadores sem a perda de identidade. “As raízes estavam na revivescência da consciência do passado árabe, nas novas escolas e na ênfase posta por reformadores islâmicos no primeiro período da história islâmica... em que os árabes eram predominantes”. (HOURANI: 1994, pg. 313).
Com isso, após o fim do domínio europeu, as nações árabes conservaram sua identidade ideológica adquirida com o surgimento do islamismo. Atualmente, é notório o fato de que as palavras do Al Corão regem em amplitude total a vida nos países islâmicos, sofrendo variações de acordo com o radicalismo do governo. São os escritos do Al Corão, das Haddit e a Sharia, que constituem o tronco onde toda a ideologia árabe se desenvolve. Allah é uma verdade inquestionável e a conduta moral, cívica, política e pessoal é vivida de modo a agradá-lo.
É inarredável o ritual religioso da vida cotidiana. A religião é a essência da vida. O que fundamenta a conduta muçulmana: Uma prática constante das boas obras e obediência, a fim de que no Dia do Juízo, sejam aceitos no Paraíso.
Desse modo, o mencionado confronto ideológico, é decorrente do estranhamento. De um lado, está o liberalismo encontrado nas sociedades ocidentais ditas cristãs. Para o muçulmano é incompreensível como à religião cristã pode ter padrões morais e éticos tão deficientes. Do outro lado, está a incompreensão quanto às sociedades muçulmanas, que de acordo com a visão ocidental impõe padrões opressivos e antidemocráticos aos seus membros. Essa é, sem dúvida, uma discussão extensa.
Após refletirmos sobre toda essa conjuntura que envolve o contexto islâmico, é possível perceber quão complexo é a conversão para os muçulmanos. Essa atitude é considerada uma apostasia, uma rejeição não apenas das doutrinas islâmicas, mas, consequentemente, das estruturas familiares, políticas e sociais que nela se estruturam. E, no caso particularmente das conversões ao cristianismo, é injustificável, impraticável, e inconcebível. É uma grave distorção dos caminhos de Allah.
Entretanto, não podemos desprezar o fato de que suas raízes os transformaram em um povo hospitaleiro, amigável e respeitoso. Eles possuem uma sincera necessidade de encontrar Deus, e por isso, abraçam com firmeza sua religião e praticam-na o mais fielmente possível. De modo geral, levar as Boas-Novas requererá conhecimento bíblico, um bom preparo teológico e apologético para responder as questões de fé com segurança. Será preciso uma doação de tempo para criar vínculos de amizade, disposição para perseverar, ofertando quem sabe a própria vida!
Nesse propósito devemos nos lembrar do exemplo do Senhor Jesus, que se doou em favor de muitos. A nossa missão é amar este povo, reconhecendo o propósito de Deus, traçado na eternidade: “... em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gênesis 12:3). Issh’allah!
Vanessa Mota